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Histórias da cidade: "Eu sou a arquitetura portuguesa", afirmava Fernando Távora

  • Paulo Alexandre Neves

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No próximo dia 25 assinala-se o centenário de nascimento de Fernando Távora (1923–2005), fundador da "Escola do Porto", cidade onde deixou a sua importante marca em diversas obras – bairro social em Ramalde (1952-1960), remodelação e ampliação do Museu Nacional de Soares dos Reis (1992-2001), restauro e adaptação do Palácio do Freixo a pousada (1995-2003) e Casa dos 24 (1995-2003). Um nome que contribuiu, sem dúvida, para a afirmação da arquitetura como área de estudo e criação da Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto (FAUP), em 1979.

Foi professor de Álvaro Siza Vieira e lidou, de perto, com Eduardo Souto Moura, que lhe chamou o "bisavô da Europa", “uma figura histórica e universal". Sobre ele escreveu Álvaro Siza Vieira: "Por causa das suas origens aristocráticas, da sua erudição e do seu constante interesse pela cultura popular e a realidade do seu país, Fernando Távora era um príncipe, o 'Visconti da Arquitectura Portuguesa', como alguns lhe chamaram". (in "Uma maneira de fazer portuguesa" - Uma Questão de Medida, Casal de Cambra, ed. Caleidoscópio, 2009, p. 259).

Fernando Luís Cardoso Meneses de Tavares e Távora nasceu dia 25 de agosto de 1923, no Porto, no seio de uma família aristocrata rural de Guimarães. Fez o exame de admissão à Escola Superior de Belas Artes do Porto (ESBAP), em 1941, frequentando o Curso Especial de Arquitetura, de onde saiu diplomado, em 1952.

Ligações ao ensino universitário

A sua ligação à ESBAP mantém-se por alguns anos, depois do convite do professor Carlos Ramos para abraçar a carreira de docente. Deixa aí, logo, a sua marca, através de um ensino pouco dado aos cânones do academismo oficial. Em 1954, n' O Comércio do Porto, escrevia: "as escolas superiores de Belas-Artes necessitam que seja posta em vigor a sua reforma há tanto desejada e sem a qual os futuros profissionais não poderão estar à altura".

Durante a sua carreira de docente universitário, e para além da ESBAP, manteve ligação à FAUP (chegou a ser presidente da comissão instaladora) e à Universidade de Coimbra, mais concretamente ao Departamento de Arquitetura da Faculdade de Ciências e Tecnologia (DARQ-FCTUC), constituído nos anos oitenta do século passado, em colaboração com Alexandre Alves Costa, Domingos Tavares e Raul Hestnes Ferreira.

Para além da obra – também referência para o mercado municipal de Santa Maria da Feira (1953-1959), casa de férias, em Ofir (1957-1958) e a reabilitação urbana do centro histórico de Guimarães (1987), entre outras –, ficaram alguns artigos, como "O Problema da Casa Portuguesa" (1945), onde Fernando Távora se posiciona contrário face à cultura tradicional vigente, defendendo a arquitetura moderna, "a única arquitectura que podemos fazer sinceramente" (in "O Problema da Casa Portuguesa", Cadernos de Arquitectura, n.º 1, Lisboa, 1947, p.6.).

Colecionador de Fernando Pessoa

Colecionador compulsivo – reuniu uma das mais importantes coleções privadas de Fernando Pessoa e do modernismo português –, o fundador da "Escola do Porto" dizia de si próprio: "eu sou a arquitectura portuguesa". Membro da Organização dos Arquitetos Modernos conheceu, ao longo da sua carreira, entre outros, Le Corbusier, Lúcio Costa e Óscar Niemeyer. Trabalhou como arquiteto da Câmara Municipal do Porto, no CRUARB (Comissariado para a Recuperação Urbana da Área da Ribeira Barredo) e na Comissão de Coordenação da Região Norte, entre outras instituições. Foi Membro Conselheiro do Comité de Cursos de Campo de Arquitectura da Comunidade Económica Europeia.

A 9 de junho de 1993, foi agraciado com o grau de Comendador da Ordem Militar de Sant'Iago da Espada. Faleceu a 3 de setembro de 2005. Foi a cremar, calçando as velhas sandálias de viagem, sempre rodeado de familiares, amigos e admiradores.

Hoje existe um prémio de arquitetura com o seu nome - Prémio Fernando Távora. O seu vasto espólio está aberto, ao público, na Fundação Instituto Arquitecto José Marques da Silva (FIMS), instalada na Praça Marquês de Pombal, onde se podem ver também obras de outros arquitetos, como José Carlos Loureiro, Alcinho Soutinho, João Queiroz ou Manuel Teles.